terça-feira, 28 de junho de 2011

Tô fraco! Tô fraco!


Fui curtir parte do feriadão de Corpus Christi no sítio de um amigo. Fui lá ciente que o convite também era uma convocação para que eu dedicasse parte da estadia na cozinha da casa, fazendo a alegria deles que poderiam se esbaldar pelo campo, pomar e redes sem se preocupar com a comida. Aceitei a função pois são amigos fiéis e merecem tal dedicação e, no caso, eu não comeria sozinho, mote deste blog.
O dia estava absurdamente ensolarado e o céu era de um azul pleno, pedindo um amarelo cacho de acácias para se mostrar mais azul ainda. Sem acácias florindo, os ipês fizeram as vezes de causar o contrastante impacto visual com a sua floração dizendo: "Como é bom encantar os humanos".
Mas o assunto aqui é comida e, chegando no local, a visão que tive de um fogão à lenha me animou bastante: cozinhar num é privilégio raro para habitantes urbanos. E pus-me a pensar: o que cozinhar para este pessoal? Logo uma visita à horta tornou-se fundamental, já que o que se planta no sitio é 100% orgânico, o dernier cri da culinária nos dias de hoje. Lá fui eu à caça de inspiração.
Porém, andando até a plantação numa aprazível trilha no campo, meus ouvidos foram atingidos por um canto - ou seria um grito? - de "Tô fraco! Tô fraco!". Fez-se a luz na minha procura ao cardápio que poderia surpreender os comensais: farei uma galinha da angola.
E lá estavam elas, desfilando soltas pelo mato nos presenteando com suas belezas africanas. Esta galinha não deve ser criada confinada pois seu território é aquele das andarilhas, daí ter uma alimentação tirada da terra e das plantas, o que a torna muito "orgânica" e portadora de uma carne saborosa.
Resolvido o drama do menu, troquei ideia com a mulher do caseiro a convocando para o pior da ocasião: o sacrifício e preparo da penosa. Neste campo não tenho muita prática e derramamento de sangue não é o meu forte (os vegetarianos adorarão esta frase) e a senhorinha foi gentil aceitando a tarefa e, tempo depois, levou a galinha já morta e limpa de suas penugens, deitadinha numa panela de pedra, pronta para o preparo. Suspirei aliviado e lá fui eu fazer o prato que surpreenderia os amigos que, até na hora de se sentarem à mesa, não souberam o que seria servido.
O cheiro despendido do cozimento encheu a casa de um perfume animador e o visual do prato ficou atraente. Ninguém desconfiou que era uma galinha da angola, já que cozida sua aparência é de um frango caipira, mas o degustar da forte carne de caça (termo meu) foi aprovado e fez um belo casamento com um vinho (também orgânico) que levei. Como os rostos ficaram iluminados à mesa.
Depois do restauro de cada um, as redes acolheram os convidados que se deixaram levar pelo barulhinho do córrego, o farfalhar das árvores e o canto discreto dos passarinhos e dormiram o sono dos justos, ou dos satisfeitos.
Já eu fiquei olhando a paisagem sentado num balanço na varanda e lá longe, bem baixinho, pude ouvir o grito das parceiras da tarde com o seu "Tô fraco! Tô fraco!" feliz por estarem soltas no mundo e ainda longe de serem as preferidas dos cardápios de muita gente.
Segue no outro post a receita do prato.

Um comentário:

  1. Sinto muito, mas esta eu não posso perdoar,rs...

    "Neste campo não tenho muita prática e derramamento de sangue não é o meu forte (os vegetarianos adorarão esta frase)"

    Vá debochar da vovó d'Angola!, rs...

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